domingo, 7 de outubro de 2012

Dia de Reunião

Sala de reunião lotada. Olhos sonolentos, recém saídos do fim de semana, ainda pedindo pelo aconchego da cama quente que deixou para trás.
 
Segunda-feira, sete horas da manhã é pedir demais. Impossível que o cérebro trabalhe a todo pano. Ela mal conseguia abrir os olhos, quem dirá assimilar a enxurrada de informações de pessoas que supostamente (apenas supostamente) conheciam mais que qualquer um naquele lugar. Passou os olhos por todos os rostos da sala e, de repente, caiu em si: aquilo não tinha mais nada a ver com seus anseios. Desejava o mundo inteiro e ali, sentada, sentia-se tão presa, tão limitada.
 
Voou então. Saiu de si. Se o corpo jazia preso em uma cadeira, sua mente era livre. Tudo bem que sentia olhares que fuzilavam sua inércia perante todos os outros. Não se importava. Pensou em todos os filmes que ainda assistiria, em todos os livros por ler. Em todas as conversas que teria, nas músicas que ainda não conhecia... E, sem querer, lembrou que amava o que fazia, mas faltava-lhe a paixão dos tempos idos. Isso doía.
 
Voltou ao corpo. Aquietou-se. Voltou para dentro de si. Olhou para sua própria alma. Acarinhou-a. Buscou. Nada encontrou. Olhou em volta novamente, tudo continuava igual. Apenas ela mudara.

sábado, 1 de setembro de 2012

Última lágrima

O cheiro atinge as narinas sem nenhum pudor. Passa pelos corredores e bancadas puidas sem respeitar velhos ou crianças, doentes ou sãos. É uma mistura de produto de limpeza e sabão, com o leve toque agridoce de sangue, que deixa todos no local com expressão funesta.
 
Ao longe o som do choro doido de uma criança, isso, misturado com a tosse seca do velho ao seu lado, só fazia a situação piorar.
 
No fim do corredor uma enfermeira, muito bonita por sinal, cuidadosamente limpava manchas vermelhas de uma maca; apesar das luvas de borracha, teve certeza que aquelas mãos eram muito delicadas, tal qual era a beleza de seus gestos. Ficou encantado e não conseguia desviar os olhos daquela figura etérea, tão deslocada em meio ao caos. Seus movimentos suaves, o vai e vem das mãos, os cabelos sedosos caindo em cascata sobre o rosto, parecia fazer amor, mas os panos em suas mãos, antes alvos, agora gritavam com o vermelho vivo do sangue que o encharcava, não o deixava esquecer de onde realmente estava. E a lembrança não era nada agradável.
 
De repente, um turbilhão de pensamentos invadiu sua mente, sem cerimônia, sem permissão. O que estava fazendo deitado ali? Tentou se levantar, mas sentiu a cabeça girar. A verdade o apanhara de chofre e não estava certo de que queria se lembrar. Um telefonema, uma briga, as chaves da moto, o choro, a perda... os faróis e por fim, a dor. Desespero.
 
Olhou para os lados, procurando pela bela enfermeira, não a via mais. Tentou gritar, a voz não saia. Pela primeira vez teve medo. Não podia terminar daquele jeito, não depois das coisas horríveis que dissera a ela. Como tinha sido injusto.
 
Sentia o peito apertado, como se a mão de uma gigante lhe apertasse o coração, esmagando-o. Olhou em volta novamente, precisava de ajuda. Foi então que ouviu aquela voz, a mesma voz rouca e doce que, nos últimos três anos, sussurrava juras de amor em seu ouvido todos os dias. A mesmo voz que lhe disse a poucas horas que tinha acabado e que não a procurasse mais.
 
Sentiu as lágrimas escorrendo pelos olhos, encharcando o travesseiro. Não chorava pela dor quase insuportável, muito menos pelo medo que sentira instantes antes. O choro sentido era pela certeza de que perdera tudo que lhe era mais caro, a vida não vivida. Não suportou. Uma última lágrima escapou dos olhos já quase fechados. Agora sim, terminara.

sábado, 21 de abril de 2012

Romance Moderno

Se conheceram on line, tão comum e corriqueiro que nem causa mais espanto. Conversaram, combinaram e para o  msn migraram. Logo mais se encontraram. Não demorou muito se beijaram, se amaram. Na cama terminaram. E lá se fartaram, o desejo saciaram.

Mas depois de tudo, porém, palavras faltaram para dizer o que realmente pensavam sobre o sentiam na alma. Se era amor ou apenas paixão, nunca sequer cogitaram, definir o quanto se gostavam.

Então, um dia se afastaram. Tão rápido quanto se uniram, se desligaram. E foram para opostos lados, cada qual guardando consigo o que nunca falaram.